Saturday 10 July 2021

Consistencia e keep it simple!

 

Os que me conhecem sabem que nestas coisas dos desportos de resistência, apregoou-o a viva voz que a consistência e a paciência são a base.

Sou tb um adepto do “keep it simple”. Raras vezes uso um “gadjet” durante o treino, a não ser um relógio para ver o tempo de treino e o pace/velocidade a que vou. Não que tenha algo contra os gadgets, mas analisar sistemas com muitas variáveis, só causa confusão e retira o focus no que realmente é importante. Embora tb ache que alguns gadgets abusam da pseudo ciência.

Quer isso dizer que não monitorizo o treino? Não, mas faço-o de uma forma muito simples.

Limito-me a registar no Strava a taxa de percepção de esforço de cada sessão. De 1 a 10.  Em que 1 é muito fácil e 10 esforço máximo. Abaixo um exemplo.

Não é um método exacto, existe alguma subjectividade, mas se houver consistência na atribuição da taxa, a informação é útil. Há que tentar ser honesto e “justo” nesta avaliação.

Com essa informação o Strava calcula a carga da sessão e vai calculando os valores de Fitness & Freshness. Que na pratica não são mais que indicadores do tipo ATL (Acute Training Load (a Fadiga)) e CTL (Chronique Training Load (o Fitness)) que já expliquei em textos anteriores.

Abaixo mostro as minhas “curvas” dos últimos 3 meses.

Desconheço os algoritmos que o Strava usa para calcular estes indicadores, mas isso não é relevante. O importante é o algoritmo ser sempre o mesmo. Não perco muito tempo a olhar para estes gráficos (embora devesse), mas às vezes eles até dizem alguma coisa.  

É importante tb entender que estes algoritmos se baseiam em estatísticas. Como em media, uma pessoa reage às cargas. Não somos todos iguais e em certa medida o algoritmo pode não representar o comportamento de um certo individuo. Há-que cruzar estes dados com indicadores pessoais, como a qualidade de sono, a irritabilidade, as sensações, etc.

É fácil entender que a “Forma” varia na direção oposta da “Fadiga”. Recomecei a nadar em Abril, e o gráfico da fadiga não engana. O corpo acusou a carga da natação (subida do indicador fitness). Demorou até que a “Forma” começasse a subir. Os pontos a vermelho são as provas onde participei. Triatlo do Cercal, Oeiras e Triman, por essa ordem temporal.

Interessante ver que no dia do Triman a curva da forma estava no seu valor máximo. Explicável por ter aliviado o treino 1 semana, algo que não sucedeu nas outras provas. Facilmente visível nos gráficos. No entanto, para mim, o mais fundamental é a consistência do valor do “Fitness”, que é o que mede o volume/carga de treino ao longo do tempo. É esta consistência que considero fundamental.

Semana após semana. Mesmo na semana do Triman, esse valor esteve estável. Na realidade, o que fiz, foi fazer uma semana com volumes típicos contabilizando o dia da prova. Nessa semana não fiz mais nem menos que nas outras. Fiz foi muito mais numa única sessão. Que o gráfico debaixo facilmente demonstra.

Gosto sempre de recordar historias da vida real. Lembro-me de ter participado numa discussão onde alguém dizia que o Vasco Vilaça como estava a treinar na Suécia, tinha acesso a “alta tecnologia” e isso ia ser fundamental para evoluir. Depois do sucesso que ele teve o ano passado, o treinador dele deu uma entrevista em que simplesmente dizia que a maior razão do sucesso dele foi ter conseguido fazer uns bons blocos de treino com consistência durante a pandemia.

Temos alguns bons exemplos de treinadores nacionais que conseguiram criar as condições para os atletas evoluírem. Cito como exemplo, o Paulo Antunes. E os resultados estão á vista. Não é preciso ir para a Suécia 😊

Outro excelente exemplo é o Paulo Sousa e a sua “esquadra” de Triatlo. O seu enorme talento e profissionalismo para criar um grupo de treino onde se respira uma filosofia de alta performance, levou a que tenha conseguido qualificar para os jogos Olímpicos 7 atletas da sua esquadra.

E ele é um grande defensor da consistência e do keep it simple.

As ferramentas sem a atitude, não servem para nada. Primeiro sejam consistentes e pacientes, só depois façam uso dos gadgets 😊 Mas não exagerem, KISS!! 

Thursday 1 July 2021

Northwesttriman - Um Triatlo de Distancia Longa diferente

 


O que se segue é um texto longo. Resume as minhas emoções e recordações quando revejo mentalmente o momento.

No passado Domingo voltei a participar num Triatlo de Distancia Longa, na famosa distancia celebrizada pela marca “Iron Man”, 3.8km a nadar, 180km a pedalar e 42km a correr.

Foi a minha 4ª participação neste desafio, todas elas no mesmo local. No Northwest Triman na pequena cidade de “As Puentes” no norte da Galiza.

Foi uma participação diferente de todas as outras. Depois da ultima participação em 2019, tinha decidido fazer uma pausa de uns anos nestas distancias. Fazer estas provas em modo competitivo, obriga a muitas horas de dedicação. Muita entropia numa vida já de si atarefada.

 O antes:

Mas no ultimo dia das inscrições para 2020, a pedido da família, inscrevi-me. Só assim faria sentido voltar a participar. Tinha que vir deles. A vontade tb tinha que ser deles.

Depois veio a pandemia e 2020 não aconteceu. E entretanto a pandemia entrou por dentro de 2021 e convenci-me que a prova ia ser adiada para o final do ano. Mas não foi 😊

Confrontado com o não adiamento e tendo em conta que em 2021 o meu treino tem sido virado para as distancias curtas, vi-me assaltado por algumas duvidas. Não vou? Tento mudar a inscrição para a média distancia? O que fazer?

Empurrado pela família, decidi deixar estar, tentar encarar a prova de forma diferente. De uma forma relaxada e tranquila, sem pressões competitivas. Sinto-me bem fisicamente e de saúde, a base e a consistência do treino está no corpo, sentia-me confiante para os segmentos de natação e ciclismo. Tinha consciência que me faltava o volume na corrida. A única o forma de conseguir fazer a corrida (e era só um pensamento incerto), e em modo de sobrevivência, era tentar chegar o mais imaculado possível a este segmento. Teria que nadar, e em especial pedalar, muito defensivamente. Esperar que as condições do dia não estivessem muito agressivas, alimentar-me bem e ver o que conseguia fazer na corrida. Queria pelo menos correr 20km continuamente.

Apesar de ir sem objectivos, não queria demorar mais de 12h, para ainda ir jantar com a família a tempo e horas. Além do mais, dias antes da prova, apercebi-me que tb havia um Portugal Bélgica para ver. 12h era razoável.

A minha preparação especifica constou num bloco de 2 semanas em que procurei fazer mais de 60km/semana. A corrida mais longa foi de 20km. Curto, mas deu para perceber que até ai iria bem.

Adoro o local da prova. Já criei laços com o mesmo e com algumas pessoas. Este ano tudo correu muito bem. A viagem, o rever as pessoas, o desfrutar da Galiza e da própria localidade. O descanso nunca é o ideal, mas faz parte. Há-que encontrar o balanço. Afinal ia passar uns dias de férias e pelo meio tinha um Iron Man para fazer.

A previsão do tempo para o dia não era animadora. Apesar de Sábado ter estado um dia agradável, o esperado para Domingo era a vinda da chuva e uma baixa significativa da temperatura. 15 graus de máxima. Tentando ver o copo meio cheio, o estar fresco ia ajudar na corrida, onde a dureza começa a sério.

Este ano, devido á pandemia, a corrida era realizada junto ao lago, num percurso praticamente todo em terra batida. Na mesma 4 voltas de 10.5km, que tal como no percurso dentro da cidade, um falso plano. Ganhávamos em beleza da vista, perdias no apoio e no calor humano (embora não tenha sido bem assim).

 Por dentro:

A prova este ano começava mais tarde de forma a evitar o que sucedeu em 2019. A neblina matinal obrigou ao cancelamento do segmento de natação. E para evitar ajuntamentos na corrida, a prova de Media Distancia começava 1º.  8h. A longa distancia às 8h30’. Os atletas da LD só poderiam entrar na box às 7h45’.

Isso fez com que acordasse a horas normais, sem stresses. Eram 7h estava a tomar o pequeno almoço tranquilamente só. A família queria dormir 😊 O hotel onde fiquei é a 2 km do lago. Decidi caminhar tranquilamente até lá. Era o meu momento zen solitário da manha. Ainda me ofereceram boleia, que prontamente recusei. Queria aquele momento para mim.

O meu único receio, dado o trauma de 2019, era que estivesse de novo neblina no lago. Vinha para fazer um Triatlo, não um Duatlo Longo. Duvidas que rapidamente se dissiparam quando cheguei ao lago! Nada de neblinas matinais!!!!

Dentro da Box foi tudo tranquilo. A partida da natação foi em rolling start, 2 atletas de 5 em 5’. Tudo funcionou com uma precisão incrível. De forma ordeira. Lá parti. Agua algo fria. Mas era para ir indo, no relax. Sem bater pernas, relaxado, sem grande esforço. Por volta dos 3km comecei a sentir frio, talvez por ir demasiado relaxado. Frio que se apoderou de mim na T1. Estavam 12 graus e eu tremia que nem varas 😊

Sabia que ia estar fresco, por isso levei por cima do tri suit um colete sem mangas. Ajudava tb na alimentação. Podia levar toda a alimentação comigo. Isso era importante. Arrependi-me de não ter ido mais tapado, demorei a aquecer, e sempre que chovia, voltava a arrefecer. Numa prova em que precisas de conservar energia e queres ir o mais confortável possível, não era bom.

Mais uma vez, o relógio apenas serviu para ver as horas e por ai estimar grosso modo os ritmos. A 1ª vez que olhei para ele foi quando comecei o segmento de ciclismo. E percebi que o tempo na natação foi uns 10’ a mais do que esperava. Mesmo indo no relax. Ainda não consigo explicar o sucedido. Em anos anteriores, nadei da mesma forma, e fiz menos 10’. Penso que terá sido um misto de ainda ter nadado mais lento, da agua estar algo choppy devido ao vento, e de o percurso ter na realidade mais de 4km. Em geral todos os tempos da natação foram altos.

O segmento de ciclismo foi em modo para arranca sem forçar nada. A ideia de chegar imaculado á corrida prevalecia. Parei certamente umas 15 vezes. 7 ou 8 para urinar (um fenómeno que já me sucedera em 2016 e que atribuo ao ir com frio), mais duas por cada volta. Uma para tirar fotos com a família e outra para reabastecer de líquidos. O regulamento este ano obrigava a paragem total nos reabastecimentos de ciclismo. Havia mesas self service. Os voluntários apenas diziam o que estava dentro dos bidons, mas não os podiam dar.  

As paragens tb serviam para avaliar o estado das pernas. E os sinais eram positivos. Fui sempre bastante confortável até aos 120k. A partir dai comecei a sentir desconforto na zona lombar e na zona do selim. Mas fisicamente ia bem, e isso era o mais importante. A alimentação e hidratação ia certinha!

Cheguei tranquilo à corrida, como pretendido. Fiz uma T2 pausada, estiquei-me um pouco e segui para o segmento. Os 1os km são sempre estranhos. O corpo precisa de encontrar o seu ritmo. Mas após o 5º km comecei a ter boas sensações. Não sabia a que ritmo ia. Claramente lento, mas não a passo de caracol 😊 Nesse momento podia claramente ter imprimido um ritmo diferente. Mas contive-me. Era muito cedo, e sabia que muscularmente não estava preparado para os 42km.  Parei novamente 1 x volta para urinar e nos reabastecimentos de 5 em 5km. Alimentava-me, hidratava-me e seguia. A única parte do percurso que não fazia a correr era a rampa dos 19% de inclinação.

Com o passar dos km, as pernas iam mostrando sinais de desgaste. Começavam a ficar pesadas, mas a meta tb estava mais próxima. Era procurar não ver o todo. O objectivo era correr até ao próximo reabastecimento. Depois desse, até ao seguinte. E assim foi, sempre certinho no ritmo.

Quando passei os 20km , as minhas expectativas já estavam cumpridas. Tudo o que viesse agora, já era ganho. O meu focus passou a ser terminar abaixo das 12h. Tens sempre que te “agarrar” a algo. E assim lá consegui correr os 42km sem caminhar!!!

Os meus receios de falta de apoio no segmento de corrida, não se confirmaram. Não faltou público a incentivar e mesmo quando não havia, lá estavam os incensáveis voluntários. Tremendo.

E assim terminei o meu 4º Triman. 11h49’, dentro do objectivo! Mais 50’ do que fiz em 2016. Obviamente que com condições diferentes, mas acima de tudo, uma atitude e idade diferentes. Nesse dia ia para o melhor possível. Mas este tb foi aquele em que sofri menos, em que partilhei mais o momento com a família, o que me deixa uma boa sensação imediata. Talvez até a vontade de voltar a fazer um em modo mais competitivo 😊. Algo que já estava fora dos planos. A ponderar.

 O depois:

Agora é descansar e voltar ás rotinas e às provas curtas!

Muitos foram os que me ajudaram nesta jornada. A todos eles um agradecimento de coração e embora nestas coisas já seja um lugar comum, um agradecimento especial à família. Não só pelo apoio durante toda a jornada, mas por suportarem toda a preparação para esta aventura. Este dias ficaram no coração. Vão perdurar para sempre.

E como sempre digo, não é pelas horas que passo a treinar, mas sim pelas horas em que estou cansado e não estou 100% disponível mentalmente como deveria estar. Já não falando dos planos por vezes adiados devido à logística dos treinos.

Bons treinos!